O mar é uma extensão dos meus membros
um estiramento dos meus ossos
sempre estive lá como ele com ele nele
uma profunda comoção me acerca quando próxima a ele
útero mórfico plano insustento abraço de rochas
um mar já vivia dentro de mim antes de mim
e sua salobridade me vem a boca até sem o querer
- quase transbordo corais e sereias
suas areias são contas de contos de um sinistro rosário
alardeiam filamentos de corpos e preces por retornos
nada me passa desapercebido quando nele me deposito:
aves, vultos de peixes, orgia de algas, cheiro de terras
um eu que não é meu, que sempre foi dele
- o vento que lhe encrespa a face é o vento que me afaga
é desta fúria dos elementos que se embebeda a alma
e é nele que ela hiberna durante os malogrados temporais
O mar sempre coube em mim - mistério!
Mudam as estações e os homens
mas a sua impermanência é um alento
neste mundo de coisas rápidas e descartáveis
no seu plano de existência a lição da transitoriedade
é a regra da casa
dá-se, generoso que é, todos os dias ao céu por espelho
ele é o único que me rouba os olhos
que me quebra a bússola
que me rompe os tímpanos
O mar se confunde com esta minha momentânea estampa
e qualifica minha concha me ornando de cal e sol.
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